quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O Palco de Agatha - Parte 21

Tomas olhou para Agatha novamente. Deu três passos e se aproximou mais do palco. Seu olhar era dolorido, agoniado. As mãos fechadas em punho. O rosto triste com um sorriso melancólico:
- Um dia Antonella me apresentou uma garota no colégio, que era sua melhor amiga. Ele era tão linda. Tinha os cabelos negros compridos e lisos, e os olhos eram tão azuis. Naquele dia eu descobri o meu céu. Nada mais importava, meu único objetivo daquele dia em diante era fazer aquela garota sorrir. E quando ela dançava ballet, era mágico. Era como se a minha alma saísse do corpo e não conseguisse mais voltar. E quando eu me casei com essa garota, eu me tornei o cara mais feliz do mundo todo... mas... a vida é engraçada. Às vezes ela nos dá coisas apenas para ter o prazer de tirar depois. Minha bailarina se perdeu para sempre quando esse teatro desmoronou.

Agatha olhava Tomas emocionada. As sombrancelhas se uniram numa espressão de quem ia chorar. Ela se aproximou da ponta do palco, olhando Tom com seu sorriso meigo de boneca de porcelana:
- Não Tom, não meu amor... você não me perdeu... eu estou aqui, pra você, pra sempre.

Tomas fitou o chão, e novamente olhou para Agatha. Agora seu olhar não era mais melancólico e sim duro, frio e gelado. O rosto agora era sério, e as palavras soavam como farpas:
- Você? Eu não conheço você. Minha Agui não é um ser maligno que causa dor aos outros. Minha Agui nunca me machucaria, nem aos meu amigos. Ela era doce, ela era amor. Olhe pra você, Agatha! Você é um monstro. Que tipo de ser você é? Com esses cipós presos ao seu corpo, com esses olhos e poderes horripilantes. Você é má, você é puro ódio. Por você, esse corpo frio e essa alma negra, eu não sinto nada. Você não é a minha Agui... nunca mais vai ser!

Aquilo não era apenas farpa, mas estilhaços de vidro correndo pelas veias de Agatha lhe causando dor. Os labios de porcelana tremiam, o rosto de boneca estava angustiado e os olhos verdes cintilantes, embora não pudessem derramar lágrimas, estavam agonizantemente tristes. Mas ela sabia que Tomas estava certo.
- Tem razão... -suspirou a bailarina - eu sou um monstro. O que eu estava pensando? A verdadeira Agatha, por mais poder que tivesse, jamais machucaria uma mosquinha. Eu não deveria estar viva. Eu não existo mais. Não quero que a presença desse monstro que eu sou apague a imagem de que eu era. Só há dois sentimentos em meu coração. Meu ódio obscessivo por te perder, e meu amor psicótico deformado pela morte. Eu te amo Tomas, e por isso não vou mais te atormentar.

Aquilo também rasgava Tomas por dentro. Jamais em sua vida ela achou que um dia teria de magoar Agatha. O objetivo de sua vida era fazê-la sorrir, não chorar. Os estilhaços nas veias de Agatha também corriam na veia de Tom. Lágrimas pesadas caíram de seus olhos, mas Agatha não percebeu. Ela estava imersa em devaneios, a dor estava anestesiando a realidade. Agora ela era uma perfeita boneca de porcelana, parada, com os olhos perdidos.

Os cipós que enforcavam Antonella e Gerard se afrouxaram e suavemente os colocou no chão. Retrocederam e libertaram também as pernas de Agatha. Andrew, ainda no piano, fitava a grande parceira de ballet, como se pudesse ler a sua mente. Agatha se virou para ele, e ele entendeu o seu olhar:
- Sim, é o certo a fazer... -suspirou o bailarino.

Andrew começou a tocar uma música de ballet no piano. A música era triste, como se tocasse para o velório de um cisne. Seu rosto, sempre sereno, agora estava mergulhado numa tristeza que Tomas, Antonella e Gerard não compreendiam. Os três se entreolharam, e depois voltaram a fitar Agatha, sem saber o que ela faria agora.

Agatha olhou Tomas com um sorriso melancólico, pois-se novamente na ponta dos pés e dançou como um cisne até a faca caída perto do palco. Pegou a faca e olhou novamente para Tomas:
- O certo a se fazer...

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